¹ Havia, entre os fariseus, um homem chamado Nicodemos, um dos principais dos judeus.
² Este, de noite, foi ter com Jesus e lhe disse: Rabi, sabemos que és Mestre vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele.
³ A isto, respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.
⁴ Perguntou-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer, sendo velho? Pode, porventura, voltar ao ventre materno e nascer segunda vez?
⁵ Respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo: quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no reino de Deus.
⁶ O que é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é espírito.
⁷ Não te admires de eu te dizer: importa-vos nascer de novo.
⁸ O vento sopra onde quer, ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde vai; assim é todo o que é nascido do Espírito.
⁹ Então, lhe perguntou Nicodemos: Como pode suceder isto? Acudiu Jesus:
¹⁰ Tu és mestre em Israel e não compreendes estas coisas?
João 3:1-10
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Nos dias de Jesus, há mais de 2.000 anos, havia em Israel várias seitas religiosas, com suas ideias e doutrinas diferentes. Uma dessas seitas era a seita dos fariseus, cujo nome muito provavelmente significa "separado", denotando assim o comportamento dos membros desse grupo. De quem os fariseus se separaram? Daqueles, especialmente sacerdotes, que interpretaram a Lei de forma diferente deles? Das pessoas comuns da terra? Dos gentios ou judeus que abraçaram a cultura helenística? De certos grupos políticos? Todos estes grupos de pessoas os fariseus buscavam evitar, por conta de sua resolução de se separarem de qualquer tipo de impureza proscrita pela lei levítica — ou, mais especificamente, pela sua interpretação estrita dela. Por exemplo, eles entendiam que comer sem previamente se lavarem (abluções - Marcos 7:3-4) os tornavam impuros em relação a Deus. Mateus 23 chama a atenção para as suas (1) posições de autoridade religiosa na comunidade, (2) preocupação com reconhecimento exterior e honra, (3) intenso proselitismo e (4) ênfase na observação das minúcias legalistas da lei, interpretadas segundo seu próprio entendimento. Em certa ocasião, Jesus os condenou, não pelo que faziam, mas por negligenciarem “os assuntos mais importantes da lei, justiça, misericórdia e fidelidade”.
A Bíblia, no Evangelho de João, cita nominalmente um desses fariseus: Nicodemos. Ele era um renomado mestre da Lei e também um membro do Sinédrio, conselho judaico que funcionava basicamente como um tribunal legislativo e judicial, composto de sacerdotes, anciãos e escribas, com atribuição de julgar questões religiosas, políticas e judiciais. Na época, havia um Sinédrio maior, chamado de Grande Sinédrio (composto por 70 homens mais o sumo-sacerdote), que era o órgão religioso supremo na Terra de Israel, e pequenos sinédrios locais (composto por 23 homens) nas cidades de Israel.
As causas mais importantes eram apresentadas pelos judeus ao Sinédrio, na medida em que os governantes romanos da Judéia lhe haviam deixado o poder de julgar tais casos, e também de pronunciar a sentença de morte, com a limitação de que uma sentença capital pronunciada pelo Sinédrio não era válida, a menos que tivesse sido confirmada pelo procurador romano (cf. João 18:31; Josefo, Antiguidades 20, 9, 1). Conforme explica o website Jewish Virtual Library, o Sinédrio julgava os infratores acusados, mas não podia iniciar as prisões. Era necessário um mínimo de duas testemunhas para condenar um suspeito. Não havia advogados. Em vez disso, a testemunha acusadora declarava o crime na presença do arguido e o arguido poderia convocar testemunhas em seu próprio nome.
Por conta dos ensinos de Jesus, que combatiam a hipocrisia dos fariseus (mandavam que outros cumprissem seus ensinos, mas eles mesmos não cumpriam), os membros desse grupo odiavam o Senhor e procuravam matá-lo. O ódio religioso é muito antigo; Jesus, sendo 100% Deus e 100% homem, foi alvo desse sentimento maligno. Aliás, segundo os Evangelhos, o Sinédrio conspirou para matar Jesus pagando a um de seus discípulos, Judas Iscariotes, trinta moedas de prata em troca da entrega de Jesus em suas mãos. No entanto, quando o Sinédrio não conseguiu fornecer provas de que Jesus tinha cometido um crime capital, os Evangelhos afirmam que falsas testemunhas se apresentaram e acusaram o Nazareno de blasfémia – um crime capital sob a lei mosaica.
Retornando a Nicodemos, este foi encontrar-se com Jesus, à noite. A intenção de Nicodemos era que esse encontro fosse oculto a todos, por vergonha e medo dos demais membros do Sinédrio, que como dito odiavam ao Senhor. As multidões observavam os líderes judeus. Eles queriam saber o que os líderes acreditavam sobre Jesus (João 7:26, 48). Logo, se esse encontro fosse durante o dia, o Sinédrio poderia vir a saber e Nicodemos perderia tudo. Ele não continuaria a ser um homem importante. As pessoas não o respeitariam e ele seria excluído do convívio com seus pares. Toda a sua vida mudaria. Além disso, ele seria acusado de alta traição, estando sujeito a julgamento e condenação.
Parênteses: Muitos não vem a Jesus à luz dos olhos de testemunhas, por medo e vergonha do que dirão a seu respeito. Mas vem a Jesus de modo secreto, oculto, mantendo o anonimato. Tem medo de perder amigos, família, posições, poder e influência. Outros o fazem por medo da morte; há países, ainda hoje, onde ser reconhecido como cristão é equivalente a estar continuamente sob ameaça de prisão e de morte. Não tenho o propósito de julgar as ações dessas pessoas. No entanto, uma verdade é que quem vai a Jesus e que tem ouvidos para ouvir o que Ele diz, acabará inevitavelmente assumindo publicamente o relacionamento com o Mestre.
Muito embora Nicodemos tenha vindo à noite falar com Jesus, posteriormente ele reconheceu Cristo publicamente. Nicodemos tornou-se um dos discípulos de Cristo, tendo sido atraído pelo amor do Senhor, notoriamente manifesto pelos bondosos sinais sobrenaturais que Jesus frequentemente realizava. Ele decidiu ir até Jesus porque estava faminto por um conhecimento mais profundo do Senhor. E o Senhor não recusou recebê-lo, nem ouvi-lo. É interessante notar que Nicodemos, ao falar com Jesus, usa o termo plural ("sabemos", 1a. pessoa do plural - "nós"), o que poderia implicar que outros fariseus tinham o mesmo pensamento a respeito de Jesus - "és Mestre, vindo de Deus". De qualquer modo, a fala desse homem a respeito de Jesus era extremamente formalista, quase como uma "concessão" (e não um reconhecimento sincero) por aquele que, muito provavelmente, estava cheio de vaidade por causa de sua posição e conhecimento.
Parênteses: Nicodemos é o tipo de grande número de homens hoje em dia. Todas as pessoas que têm uma espécie de ligação frouxa e superficial com o Cristianismo ecoam substancialmente as suas palavras. Eles elogiam Jesus Cristo por Sua divindade e por Sua obra redentora, e parecem pensar que estão conferindo uma honra ao Cristianismo quando condescendem em dizer: "Nós, os eruditos especialistas em literatura; nós, os árbitros do gosto; nós, os guias de opinião; nós, os redatores de jornais, revistas e periódicos; nós, os líderes dos movimentos sociais e filantrópicos, reconhecemos que Tu és um Mestre."
Apesar da fala superficial de Nicodemos, Jesus o conhecia. Jesus conhecia não apenas as suas palavras, mas os seus sentimentos, seu interesse em saber mais sobre Ele; conhecia, principalmente, qual era a real necessidade daquele homem. Deus conhece além das nossas palavras que dizemos: Ele conhece o nosso real interior! Ele sabe o que realmente estamos querendo quando nos aproximamos Dele, quando oramos e o que dizemos em oração! As palavras bonitas não impressionam a Jesus, mas a realidade do coração sim; mesmo as palavras ditas sem qualquer eloquência ou retórica, se ditas do fundo da alma, em contrição e fé, são palavras que o Senhor ouve e atende!
Qual era a real necessidade de Nicodemos? Jesus disse a ele: é nascer de novo: "A isto, respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus". O novo nascimento era e continua sendo a necessidade mais básica e a mais importante que ele, eu e você possuímos! É mais importante que qualquer outra necessidade que tenhamos ou que venhamos a ter. Esse novo nascimento é que nos possibilita sermos súditos do Rei dos reis e servos do Senhor dos senhores, súditos e servos de Jesus! O novo nascimento, ou regeneração, é uma grande transformação espiritual realizada em todos aqueles que crêem e recebem a Jesus como Senhor e Salvador, operada no interior humano pelo Espírito Santo. Logo, o novo nascimento é inseparável do arrependimento e da fé.
A pessoa nascida de novo vive na certeza de que, a justiça de Deus lhe foi imputada, e agora, lhe foi proposta uma nova orientação moral, baseada numa nova criação na semelhança de Cristo (2 Coríntios 5:17: "Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo."). A regeneração não leva o homem a perfeição sem pecado, mas leva a renúncia, dia após dia, da irreligiosidade e das paixões mundanas, para que “vivamos no presente século, sensata, justa e piedosamente” (Tito 2:12). É a transformação do coração do homem, onde a vida divina é transmitida a alma humana (João 3:5; I João 5:11,12), como concessão de uma nova natureza (II Pedro 1:4: "Pelas quais ele nos tem dado grandíssimas e preciosas promessas, para que por elas fiqueis participantes da natureza divina, havendo escapado da corrupção, que pela concupiscência há no mundo.").
Deus já havia dito, no Antigo Testamento, por meio dos seus profetas, que operaria uma transformação no interior humano. Assim, por meio do profeta Jeremias, Deus disse: "⁷ E dar-lhes-ei coração para que me conheçam, porque eu sou o Senhor; e ser-me-ão por povo, e eu lhes serei por Deus; porque se converterão a mim de todo o seu coração." (Jeremias 24:7). Usando o profeta Ezequiel, por duas vezes Deus prometeu dar ao Seu povo... um novo coração! Esse novo coração os possibilitariam a obedecer a Deus: "¹⁹ E lhes darei um só coração, e um espírito novo porei dentro deles; e tirarei da sua carne o coração de pedra, e lhes darei um coração de carne; ²⁰ Para que andem nos meus estatutos, e guardem os meus juízos, e os cumpram; e eles me serão por povo, e eu lhes serei por Deus." (Ezequiel 11:19,20; Ezequiel 36:26,27). Note que, como dissemos, é esse novo coração - coração de carne e não de pedra, ou seja, um coração sensível à voz de Deus - que torna o homem capaz de andar e guardar a Palavra de Deus. Isso era algo que Nicodemos devia saber por ser mestre em Israel, mas que no entanto ignorava completamente, como disse Jesus (João 3:10).
Esse novo nascimento é feito em nós pelo Espírito Santo. Observe que não é, em hipótese alguma, voltar a nascer como nascem todos os homens. Não é voltar ao ventre materno e ter novo corpo, como erroneamente ensina o espiritismo kardecista. Não é, portanto, reencarnação, ensino contrário a tudo o que a Bíblia ensina. Permita-me enfatizar: o novo nascimento é operado pelo Espírito Santo de Deus, que é Deus, na alma de um homem ou mulher já nascido(a), que se arrepende dos seus pecados e que aceita a Cristo como Salvador e Senhor, levando-o(a) a viver segundo a Vontade de Deus. É somente por essa transformação que podemos ser, então, filhos(as) de Deus: "¹² Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, aos que crêem no seu nome; ¹³ Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus" (João 1:12,13). Há poder sobrenatural, poder de Deus, para que sejamos transformados em filhos(as) de Deus, poder este que é operado por Deus em nossa alma! Para sermos membros da família de Deus, Deus precisa nos comunicar Sua vida e natureza! É um ato de Deus e não do homem, onde a natureza do Deus vivo é implantada no homem quando este homem crê e recebe a Cristo em Sua vida como Senhor e Salvador e aceitá-Lo implica, obrigatoriamente, em identificar-se com Cristo em todos os aspectos! (veja mais: RESGATANDO O CONCEITO BÍBLICO SOBRE A SALVAÇÃO EM JESUS CRISTO (PARTE 7): A EXPIAÇÃO ).
Parênteses: Observe com atenção: o novo nascimento não é o mesmo que frequentar igreja, ainda que isso tenha o seu lugar. Leia mais sobre em ENTRAR PARA A IGREJA NÃO É O MESMO QUE CONVERSÃO
Por que precisamos nascer de novo? A conclusão mais óbvia possível é porque estamos mortos! Isso mesmo: estamos mortos em nossos delitos e pecados, desde que Adão pecou. Paulo nos ensina isso de forma muito clara: "¹ E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e pecados" (Efésios 2:1). Mortos para com Deus, por conta da nossa natureza corrompida que possuímos, que nos leva contínua e crescentemente para longe de Deus. Chamamos isso "morte espiritual", como já explicamos em outra postagem (ver: CRISTIANISMO BÍBLICO FOR DUMMIES - I ). O novo nascimento é portanto a revivificação: o homem sai do seu estado de morte espiritual e desunião, e entra numa vida espiritual de união e comunhão com Deus.
A base mais profunda da necessidade do novo nascimento reside, desse modo, no fato do pecado. Querido(a) leitor(a), a afirmação enfática e urgente de nosso Senhor é facilmente testificada a partir de um simples e honesto exame das profundezas de nossos próprios corações à luz de Deus. Pense no que significa quando dizemos: 'Ele é Luz, e Nele não há escuridão alguma.' Pense naquela pureza absoluta, que, para nós, é uma terrível aversão a tudo o que é mau, a tudo o que é pecaminoso. Pense em que tipo de homens devem ser aqueles que podem ver o Senhor. E então olhe para si mesmo. Estamos preparados para ultrapassar esse limite? Estamos preparados para contemplar esse rosto? É possível que tenhamos comunhão com Ele? Se meditarmos corretamente sobre dois fatos, a santidade de Deus e nosso próprio caráter, sentiremos a real necessidade daquilo que Jesus Cristo realmente declarou o caso quando disse: “Deveis nascer de novo”. Sem essa profunda transformação, não há Céu para nós; não há comunhão com Deus para nós. Devemos estar diante Dele e sentir que um grande abismo está estabelecido entre nós e Ele, de forma a irmos à Jesus e então sermos pelo Espírito Santo regenerados!
Agora, pergunto: você já foi até Jesus, aceitando-O como Seu único e suficiente Senhor e Salvador? Sem isso, querido(a) leitor(a), as portas do Reino de Deus permanecerão cerradas diante de você. Você está e continuará de fora do Reino! E, naquele grande dia quando Cristo voltar à Terra, você ficará eternamente do Senhor. Deus respeita e respeitará sempre a sua escolha; no entanto, hoje Ele lhe concede a oportunidade de mudar o seu futuro em relação a Ele. O que Ele falou com Nicodemos fala com você também: você precisa nascer de novo! Essa é a sua mais importante necessidade! E essa necessidade é totalmente independente de quem você seja, de quaisquer grandes privilégios que você possa herdar por seu nascimento natural ou educação, ou religião, ou a posição que ocupa na sociedade civil ou religiosa. Todos os homens, sem exceção, precisam nascer de novo se querem entrar no Reino de Deus, se querem ser filhos de Deus!
Para sua meditação, ouça o hino abaixo:
Graça, misericórdia e paz lhe sejam multiplicadas!
❤️🔥👏🙌
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