terça-feira, 5 de outubro de 2010
MENTALIDADE DE MERCADO: VOCÊ SERIA CAPAZ DE ACEITAR O SOFRIMENTO INJUSTIFICADO?
Há todo um "setor produtivo", responsável pela "produção", "colocação no mercado" e "venda" de "sucesso", "felicidade", "prosperidade", "saúde eterna", etc. Tal "produto", muito cobiçado e, portanto pelas regras de mercado muito valorizado, é "vendido" sob a forma de "produto instantâneo", "em pacotinhos" - basta adicionar água, ferver na alma por 50min e está pronto para ser consumido! Os sabores são diversos, mas em essência é o mesmo produto.
É preciso ressaltar que este produto é tanto a ideologia em si quanto a materialização da ideologia, sob a forma de apetrechos e kits de bem-estar, tais como "objetos consagrados", "oração carta de direitos", etc. A Bíblia, aqui, é reinterpretada, tornando-se o "guia de boas práticas para se alcançar o sucesso"; o pastor é o "especialista no guia de boas práticas" e a igreja é o local onde convergem as energias cósmicas, vindas de um deus que age a partir dos comandos do especialista, que ativarão os portais para a nova realidade de sucesso e felicidade. Deste modo, tudo gira em torno do bem-estar, músicas e mensagens. E tudo por um preço módico: até 30% do seu salário. No futuro, haverá um programa de milhagem associado aos gastos nas igrejas: a cada R$ 1.000 ofertado ou na compra de produtos na igreja, você acumula até 500 pontos em milhas. Como diria a "irmã" Chiquinha, grande profetiza da encrenca, "pois é, pois é, pois é..."!
Adam Smith, em sua obra "Riqueza das Nações", cunhou um termo conhecido como "Mão Invisível". Segundo ele, a interação dos indivíduos pareceria resultar numa determinada ordem, como se houvesse uma "mão invisível" que os orientasse, apesar da inexistência de uma entidade coordenadora do interesse comunal. De fato, parece haver uma espécie de mão invisível guiando os indivíduos de forma que interajam objetivando o acesso aos "welfare products". A auto-organização destes indivíduos em igrejas e instituições religiosas, como se deu no início do movimento neo-pentecostal, produzindo sacerdotes e doutrinas justificadoras, mostra esta realidade.
A triste realidade é que tal "mão invisível" estende sua influência até mesmo àquelas pessoas e igrejas que não concordam com a ideologia do "welfare products". As igrejas/denominações que outrora eram vistas como "sérias", "ortodoxas", etc. ou estão se redendo à ideologia do sucesso fácil ou estão padecendo de graves problemas para manterem-se incontaminadas. Afinal, segundo o ideário religioso-evangélico vigente, todas são igrejas e assim são todas equivalentes. Deste modo, é sempre possível escolher uma dentre as muitas, de acordo com os pré-conceitos de igreja, que melhor atenda às minhas necessidades por um menor preço.
No blog "A Verdade Bíblica", o Pr. Magdiel Anselmo traz uma reflexão muito interessante sobre o que ele chama de "mentalidade de clube" (http://pranselmoteologia.blogspot.com/2010/09/mentalidade-de-clube.html). Segundo o pastor, "muitos pensam que Igreja é como um clube. Existe para satisfazer seus desejos e anseios. Existe para agradar aos associados (membros). Existe para proporcionar aquilo que quero". Recomendo a leitura do texto, muito bem escrito, inteligente e atual.
Contudo, há outra mentalidade que é cada vez mais comum naqueles que se dizem crentes em Cristo. Trata-se da mentalidade de mercado, de compra e venda. O crente/frequentador é o comprador, detentor do capital e portanto encontra-se na condição de ditar o padrão do produto a ser comprado. O pastor é o vendedor, que se utilizará de todos os meios que estiverem ao seu alcance para conquistar e fidelizar o comprador. O produto comercializado é o "produto religioso", nem sempre material como dito anteriormente (ideologias não confrontadoras, mas que gerem bem-estar e atendimento VIP pelo pastor e obreiros, por exemplo). A igreja é o mercado, cheio de consumidores, que precisa ter necessariamente estrutura física e de serviços para melhor recepcioná-los.
Se os consumidores não encontrarem um produto pelo qual valha a pena pagar, aliado ao atendimento imediato de alto padrão pelo vendedor, eles não frequentarão mais aquele mercado. Se possível, orientarão outros consumidores a fazerem o mesmo. E assim um grupo de consumidores acabará saindo daquele mercado em direção a outro, como que guiados por uma mão invisível.
Antigamente, havia um sentimento de fidelidade à igreja. Não se mudava de igreja como hoje em dia. Mesmo que os crentes sofressem injustiças na igreja, quer por parte dos outros membros, quer por parte do pastor, raríssimas vezes isso redundava em mudança. Naquela época, os sofrimentos devidos eram entendidos como tal e os indevidos eram encarados como parte integrante e necessária na vida cristã. No primeiro, o sofrimento era merecido, consequência de atitudes erradas. No segundo, o sofrimento era motivo de glórias a Deus, no Espírito e letra de I Pedro. Entendia-se que o próprio Senhor faria justiça, a Seu tempo; entendia-se também que a igreja era mais do que aquela situação isolada.
Hoje, a mentalidade dos crentes é trocar de igreja ao menor sinal de problemas. Isso quando não saem para fundar a sua própria igreja, na acepção do termo neotestamentário "seita". E não importa a denominação: hoje batista, amanhã assembleiano, semana que vem metodista...; até o fim do ano, só Deus sabe. Hoje renovado, amanhã tradicional, passando pelo pentecostal e neo-pentecostal.
Ninguém aceita mais sofrer em prol da igreja ou da fé que professa. A igreja têm problemas? Há injustiças?Qual é a que não tem? Você sofreu uma injustiça? Quem nunca sofreu, rasgue o cartão de membresia! Será que nunca atentaremos para o que diz a epístola de Pedro? "Porque é coisa agradável, que alguém, por causa da consciência para com Deus, sofra agravos, padecendo injustamente. Porque, que glória será essa, se, pecando, sois esbofeteados e sofreis? Mas se, fazendo o bem, sois afligidos e o sofreis, isso é agradável a Deus. Porque para isto sois chamados; pois também Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as suas pisadas" (I Pe 2.19-21).
Acaso eu pergunto: isso tem base bíblica? Afinal, se somos crentes, devemos agir pela Bíblia, ainda que ela contrarie a nossa carne. Deus aprova essa prática? Se você não sabe responder, deixe-me mudar a pergunta: será que existe uma igreja perfeita, onde você jamais passará nenhum tipo de luta ou sofrimento ou injustiça? Nem na época dos apóstolos isto acontecia! Veja a igreja de Corinto: divisões e partidarismos, irmãos devorando o pão e o vinho da Ceia do Senhor (uns até bêbados com o vinho), uma babel no uso dos dons espirituais, irmão processando outro num tribunal secular. Havia até um homem, membro da igreja, que estava vivendo maritalmente com sua madrasta. Num ambiente como esse, é lógico supor que havia gente injustiçada, já que a própria injustiça reinava na igreja. Observe que a criação do ministério diaconal foi devido à murmuração na igreja em Jerusalém: um grupo de viúvas se achava injustiçado em detrimento do outro! Porém, nenhuma das viúvas mudou de igreja!
Não deixando a nossa congregação, como é costume de alguns, antes admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais, quanto vedes que se vai aproximando aquele dia (Hb 10.25). Ora, se "aquele dia" está cada vez mais perto, com mais ênfase e frequência devem os crentes serem admoestados a não deixarem suas congregações. Observe que há uma ligação causa-efeito entre "aquele dia" e a permanência na congregação, o que motiva a admoestação. De algum modo, quando chegar "aquele dia" (e ele se aproxima) haverá para aqueles que tiverem deixado a sua congregação consequências negativas. É claro que o distinto leitor compreende o significado do texto, que está a combater uma prática enraizada, um costume, um hábito.
É claro que há situações insustentáveis, que acabam compelindo à tomada de soluções drásticas. Uma delas é quando uma igreja ou seu líder abraça uma heresia, algo sabiamente antibíblico, como o sabelianismo, por exemplo. É claro que devemos lutar, ideologicamente falando, contra toda a forma de injustiça - lutar contra a ideologia, não contra o propositor dela, que fique claro. Outra coisa são as injustiças que todos os crentes que já viveram na face desta terra e que ainda viverão experimentaram e experimentarão um dia, invariavelmente. Maturidade espiritual é também saber se comportar diante das injustiças, reconhecendo-as como parte da vida cristã.
Você seria capaz de aceitar o sofrimento injustificado? Seria capaz de seguir até este ponto o exemplo do Senhor Jesus, abrindo mão do seu direito de justiça em prol do Reino de Deus?
Pense nisso. Deus está te dando visão de águia!
5 comentários:
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Pr. Ricardo,
ResponderExcluirGraça e Paz,
Texto perfeito.
Esta mentalidade de mercado é a dura realidade de nossos dias. Há muitos problemas e equívocos.
Mas, a grande maioria usa esses problemas para justificar atitudes precipitadas ou até para respaldar uma falsa liberdade cristã.
Na verdade, sempre haverá um motivo para deixar de congregar em uma igreja. Como bem disse, não há igrejas sem problemas ou injustiças. Mas, será que ficar não seria mais cristão? Será que a saída fácil não demonstra uma ausência de maturidade cristã e até, quem sabe, de conversão legítima?
Realmente, antigamente havia maior fidelidade dos membros a suas congregações. Hoje, esta mentalidade de mercado, originária desta ideologia do bem-estar contamina e atrapalha muitas pessoas. John Macarthur Jr. em sua obra "Com vergonha do Evangelho" chama essa mesma ideologia e mentalidade de "igreja agradável".
Certamente, estas mentalidades e ideologias não tem parte com a obra do Espírito Santo muito menos com a Igreja de Cristo.
Forte abraço,
Pr. Magdiel G Anselmo.
Na verdade o motivo do meu divórcio foi pq meu marido, mesmo sendo uma pessoa a quem amo e admiro, apostatou da fé ´porque descobriu q satanáz nunca existiu e que as igrejas se utilizam do diabo para ganhar dinheiro. Creio q Deus me pinçou no meio desta apostasia. entretanto, oro para q o Pai revele a Sua Verdade a o meu marido e a tantos outros que estão neste engano, satanáz enviou um aro inflamado, mas ssó Deus é poder e só o Espírito Santo tem poder para convercer o homem do pecado. Eu aceito perder o meu direito neste mundo natural, porque não somos cidadãos deste lugar, a nossa verdadeira cidade, por enquanto só podemos ver através dos olhos da fé!
ResponderExcluirA PAZ!
Ir. Nancy,
ResponderExcluirInfelizmente, a igreja atual tem se desviado da fé, apostando em direção à Mamom, na busca incessante por dinheiro, a partir da malfadada teologia da prosperidade. Isso tem caído como uma bomba no coração de muitos crentes fiéis, como escândalo, levando-os a se distanciarem de todas as igrejas (e não apenas daquelas que agem de tal maneira). É a antiga tática do diabo - fazer com que todos sejam condenados pelo erro de um.
Oremos para o retorno do seu esposo, nosso irmão em Cristo, ao redil do Bom Pastor e, querendo Deus, ao seio de sua família!
Graça e Paz!
Pr. Ricardo.
Mais uma vez pastor, obrigado pelas Palavras e não deixemos primeiro de orar por Ele , pela Salvação e também peço a Deus, segundo a Sua Vi=ontade, pela restauração do meu lar!
ResponderExcluirJá disse um grande evangelista:"Se estás atrás de uma igreja perfeita,ela não existe.Mesmo porque ,se existisse no momento que entrarmos nela ,a mesma deixará de ser perfeita."Nós,seres humanos somos assaz complicados.O ser humano não gosta de ser criticado,se fere por qualquer coisa e sempre se julga injustiçado.Renúncia,dar a outra face,é bonito ler...praticar é doloroso.Exige sofrimento,humilhação e o velho homem,que deveria ter morrido,reclama,esperneia,grita:prazer!satisfação!meus direitos!
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