terça-feira, 6 de setembro de 2011

RENOVAÇÃO ESPIRITUAL E A MÚSICA NA LITURGIA CRISTÃ


Tradução: "Isto é Heresia!" Legenda: "O órgão da igreja trocado por guitarras e tambores! Despesas gerais substituem hinários, e o pastor não usa gravata!! Gracie Smith não está contente nem um pouquinho... Deve ser o fim dos tempos."

Quem é mais antigo na jornada cristã deve se lembrar dos conflitos que ocorriam nas igrejas no início da música gospel no Brasil. Havia uma multiplicação de sermões dominicais e de artigos nos boletins das igrejas falando sobre o rock evangélico que começava a entrar em algumas denominações, exortando os crentes a não aderirem àquilo que era considerado "do diabo". Naquela época, o único instrumento permitido no culto cristão era o órgão, geralmente tocado por uma irmã que dominava a música sacra, contida nos hinários da denominação. Em alguns pouquíssimos lugares aceitava-se adicionalmente um violão.

Porém, o fato é que a música gospel chegou para ficar. Mesmo as denominações mais resistentes já estão permitindo a "música moderna" em seus cultos e reuniões. Infelizmente, há uma "polarização" na música: se a opção é aderir ao gospel, isso implica em esquecer-se do sacro, dando a impressão que ambas não podem conviver dentro do mesmo ambiente. Hinos antigos e inspirados são assim esquecidos para sempre, condenados ao ostracismo, e com eles as raízes históricas e litúrgicas da denominação. Os cultos tornam-se mais barulhentos e menos reflexivos, num ambiente onde o movimento exterior é mais importante do que o movimento interior. Saem assim de um extremo para outro: da burocrática liturgia de algumas denominações para a libertina liturgia moderna, onde vale tudo desde que tenha a alcunha de "unção", até mesmo imitar animais no culto. E isso é chamado "renovação espiritual". Renovar é tornar novo, é melhorar; mudar ou modificar para melhor. Mas o que se vê hoje na maioria das igrejas não pode ser considerado algo melhor do que era anteriormente, de forma alguma. Qual é a solução? A reversão da renovação não é uma opção, por certo.

Analisando ambos os cenários - o antes e o depois da "renovação" - ressalta a olhos vistos a relação entre a música e a expressão da espiritualidade. A música tem efeito "potencializador" sobre o homem. Porém, será que isso só acontece com as músicas modernas? Será que apenas elas tem essa influência? Ou qual a relação entre os hinos e músicas com a genuína renovação da alma humana? A relação é inequívoca: um hino ou música inspirado pelo Espírito Santo, mesmo que seja considerado "antigo e ultrapassado" por alguns irmãos, é ainda um dos instrumentos que Deus usa para ministrar Sua presença, Seu amor e Seu consolo ao homem. Deus ainda fala e age utilizando-se dos mais variados e diferentes elementos, mesmo que estes elementos tenham sido rejeitados pelos atuais edificadores da Igreja.

Há quem pense que as músicas devem servir apenas para agitar a alma humana, especialmente no período de louvor em nossas igrejas. Os ministros de louvor que assim pensam ainda não compreenderam que a música é muito mais do que um amontoado de sons sem sentido. Infelizmente, para muitos "a letra não é importante". Ora, se a letra não é importante, o que é, então? O ritmo? O volume do som, que alguns insistem em por "nas alturas"? Não importa se a letra é antibíblica, ou se não faz nenhum sentido, repleta de simbolismos pouco compreensíveis? Não precisa nem pensar muito para concluir que esse conceito de "louvor renovado dos últimos dias" está erradíssimo!

Abre parênteses: A intensidade do som, ou pressão sonora, é medida em bels (homenagem a Alexander Graham Bell, que inventou o telefone em 1877), ou mais comumente em seu submúltiplo, o decibel (dB). É definido como a divisão de uma escala logarítmica cujos valores são 10 vezes o logarítimo decimal da relação entre o valor de potência considerado e um valor de potência especificado, tomado como referência e expresso na mesma unidade. Segundo a Norma Regulamentadora Nº 15, a máxima exposição diária permissível para um nível de ruído de 100 dB é de 1 hora. Se o nível de ruído for de 115 dB a exposição máxima é de 7 minutos. Um conceito, muito comum entre os músicos e ministros de louvor das igrejas, é que "louvor ungido" é igual a "som alto", ou que “só conseguem tocar se o som estiver alto”, tornando assim o ambiente de culto insuportável em termos de potência sonora. Não há como haver unção, manifestação do poder de Deus, curas e conversões durante o período de louvor se o nível do som extrapola os limites do corpo humano. Os níveis insuportáveis de som produzem estresse e aumento da pressão arterial (sistólica e diastólica) pelo aumento da produção de adrenalina. O som muito alto prejudica ainda a concentração e performance, além de causar irritação e incômodo. Uma boa referência para consulta e estudo é a norma ABNT NBR 10151:2000 - Versão Corrigida: 2003 Acústica - Avaliação do ruído em áreas habitadas, visando o conforto da comunidade - Procedimento, a qual pode ser adquirida a baixíssimo preço no site da ABNT. Fecha parênteses.

O que os "ministros de louvor dos últimos dias" não conseguiram ainda compreender é que o louvor à Deus não é apenas "cantoria de músicas vazias e remelexo, tudo isso no mais alto volume possível". O louvor a Deus expressa gratidão e reverência, obrigatoriamente. Dependendo do contexto, desperta também o temor do Senhor aos homens. Basta sossegar um pouco a alma que facilmente pode se sentir o temor do Senhor em hinos tais como "O Banquete de Belssazar" (hino 249):

Tua vida, ó amigo,
Nesta hora escrita está;
O registro dos teus atos
Deus, no céu, escreve já;
Que Jesus, pois, te faça
Tal escrita compreender,
Que, em havendo tempo, possas
Sua graça receber.

Lá no céu, a mão de Deus!
Lá no céu, a mão de Deus!
Vê qual seja a tua sorte,
A tua vida ou morte;
Lá no céu, escreve a mão de Deus   
 
Como, pergunto, não sentir o amor de Deus a partir de hinos como "Dez Mil dos Anjos" (“Amarraram as mãos de Cristo/ Quando no Jardim orava/ e assim sofreu vergonha e dor./ Bateram em sua face tão pura e sem pecado/ e disseram: "Crucifica-o já")? Eis aí um bom hino para ser cantado nos cultos de Santa Ceia, pois é um hino que traz a memória tudo o que o Senhor Jesus fez por nós e Sua principal motivação em ser crucificado. Ou como não sentir toda ternura e consolo do Espírito Santo na letra “meu Jesus vê quando estou só/é sabedor do meu sofer/.../Ele me ampara no caminho/e diz baixinho: não está só”? Alguém já viu uma declaração mais enfática sobre o Servir a Cristo do a registrada na estrofe “Oh! Sim! Vale a pena servir a Jesus/neste mundo é melhor ter a Cristo/riquezas se vão, honra, glória e posições/mas feliz é sempre quem tem a Cristo”?

Abre parênteses: Muitos dos hinos aqui citados são de autoria de cantores – verdadeiros ministros de louvor a Deus – como o Pr. Feliciano Amaral. Desde tenra idade eu escuto-os, debaixo da tábua de passar roupa, graças a minha querida mãe que colocava os LPs de vinil na antiga vitrolinha. Creio que as mensagens desses hinos ficaram impressas em minha alma, o que me ajudou a encontrar o Senhor quando adolescente. Hoje, vejo muitas mães que anseiam pela conversão dos seus filhos, orando desesperadamente por eles (oxalá!), sem, no entanto, fazerem a “sua parte” para que a tão desejada conversão aconteça. Se as mães assistissem menos um pouco a TV, se o mundo com seus valores entrassem menos um pouco em suas casas a partir de programas televisivos de qualidade duvidosa, se elas passassem a dedicar mais tempo e sabedoria em incutir no coração dos filhos a Palavra de Deus por meio das histórias e da música, elas cedo ou tarde lograriam êxito no afã de ver seus filhos queridos no Caminho do Senhor. Fecha parênteses.

Pode parecer que aqui está se afirmando que em matéria de músicas e hinos tudo que é novo é ruim, ou só o que é antigo é bom. Essa não é a intenção. Há boas músicas evangélicas modernas, porém infelizmente cada vez mais escassas. A imensa maioria não passa de “mais do mesmo” e “manipulação emocional”. Emoção é parte do louvor a Deus? Sim; é um grande erro excluí-las do louvor e da adoração. As emoções se constituem em um dos atributos da alma humana, não apenas o raciocínio ou a lógica. É uma bênção poder adorar a Deus também com nossas emoções, onde Deus mesmo se encarrega de desbloquear a alma do adorador. É preciso reconhecer que num mundo cada vez mais impessoal, onde muitos relacionamentos são construídos em bases opressoras ou interesseiras, as emoções (quer sejam de tristeza, quer de alegria), quando liberadas na presença de Deus em reuniões menos burocráticas e institucionalizadas, são trabalhadas e curadas pelo Espírito Santo. Mas as emoções não podem ser o objetivo final dos hinos e músicas produzidos e utilizados pelas igrejas.

As emoções precisam surgir livremente, sem “forçar a barra”. Elas precisam ser espontâneas, como se deu no caso da mulher pecadora em Lucas 7:36-50, onde as lágrimas fluíram livremente a partir do encontro da alma humana com o Senhor Jesus. Como não se emocionar em Sua presença? Como não “beijar os pés” daquele que demonstra ternura e amor com o pecador arrependido? Como não “bater palmas”; como não “aclamar a Deus com voz de triunfo” (Sl 47.1)? A renovação espiritual passa inexoravelmente pela adoração ao Senhor, a qual deve ser gerada a partir de músicas e hinos cantados com inteligência, que é a capacidade de compreender e adaptar-se facilmente, o que tem íntima relação com a faculdade de interpretar o que está sendo dito e cantado – a letra da música ou hino.

Abre parênteses: Não existe nenhuma indecência ou desordem em alguém chorar ou sorrir, ou dar brados de glória e aleluia durante o culto a Deus. A desordem e a indecência passam a acontecer quando há descontrole emocional, o que geralmente acontece em ambientes onde há ênfase nesse tipo de adoração. Quando a desordem começou a acontecer no culto dos irmãos em Corinto – a igreja mais avivada do Novo Testamento – o apóstolo Paulo tratou de pôr as coisas em seu devido lugar. Assim, cabe ao pastor da igreja não coibir a espontaneidade por medo da desordem, burocratizando a adoração cristã, mas sim ensinar o ponto de equilíbrio. Cabe a ele coibir os excessos, ensinando os crentes a adorarem ao Senhor com emoções e inteligência, sendo ele mesmo o exemplo dos fiéis. Fecha parênteses.

Liberdade e espontaneidade são marcas de reuniões de igrejas renovadas e avivadas. Glória a Deus porque podemos adorá-Lo num ambiente mais alegre, onde é possível expressar todo amor que sentimos por Deus. Glórias a Deus também porque podemos fazer tudo isso sem sermos indecentes ou desordeiros. O próprio apóstolo Paulo disse que onde o Espírito do Senhor está aí há liberdade (II Co 3.17), assim é possível ser liberto sem ser libertino. Ser renovado por Deus, espiritual e emocionalmente, é uma das consequências de uma adoração dinâmica e alegre, num ambiente saudável e equilibrado. E a música tem papel importante na construção deste ambiente.

A música evangélica precisa ser entendida como uma ferramenta de apoio à renovação espiritual e isso só se dará a partir da compreensão da influência da música sobre a alma humana e da compreensão da Bíblia sobre o uso de hinos já conhecidos e sobre a criação de novas músicas. Somente a partir da comunhão com Deus e do estudo da Palavra haverá discernimento espiritual necessário para compor músicas realmente inspiradas pelo Espírito Santo e somente estas causarão impacto espiritual positivo na vida dos crentes e dos visitantes em nossas igrejas. Com esse objetivo internalizado em nossos corações, não haverá mais tensões, em termos musicais, entre o antigo de Deus e o novo de Deus, mas o antigo e o novo estarão em harmonia, cumprindo o seu papel com perfeição e maestria.

Novamente, comunhão com Deus e estudo incessante das Escrituras são os requisitos mínimos - o minimum minimorum - necessários à vida dos compositores evangélicos para que suas músicas possuam as mesmas qualidades das músicas e hinos antigos. Sem vida com Deus, não há como haver inspiração e sem inspiração, só serão compostas músicas de pouca ou nenhuma qualidade como a imensa maioria disponível no mercado. Enquanto essa triste realidade perdurar, não haverá a produção de nenhum valor espiritual permanente na vida dos crentes a partir destas músicas, apenas impressões emocionais passageiras.

Pense nisso. Deus está lhe dando visão de águia! 

Um comentário:

  1. Como é gostoso ouvir hinos reflexivos,que nos falam à alma.Hinos que nos exortam,que nos consolam,que nos enche de temor e de reverência.Também é muito bom escutarmos hinos que nos alegram e que fazem vibrar o nosso coração.Concordo,que hoje haja bons louvores,mas também há outros que nada dizem e que quando muito,fazem as pessoas só sacudirem o esqueleto.

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