quinta-feira, 9 de setembro de 2010
O CRISTÃO E A POLÍTICA III - A FORMAÇÃO DOS CANDIDATOS-PASTORES
Quando o assunto é política, um dos temas recorrentes é sobre a candidatura de pastores a cargos eletivos: um pastor deveria ser candidato? As mais variadas propostas de resposta foram sugeridas, algumas mais polêmicas do que outras, algumas mais conservadoras, mais teológicas e outras nem tanto. Há aqueles que defendem a candidatura destes com base na vida de Daniel e José, forçando assim uma interpretação do texto bíblico contra os princípios da Hermenêutica e da Exegese.
Independentemente de toda esta polêmica bíblico-teológico-filosófica, que remete ao famoso paradoxo do "ovo e da galinha" (quem tem preeminência, o ente pastor ou o ente político?), os fatos são que primeiramente a Igreja Evangélica Brasileira encontra-se dividida (isso sim é um fato!) quanto a esta importante questão, não havendo via de regra um posicionamento dominante. Em segundo lugar, é que a cada ano mais e mais pastores se candidatam.
Como eleitor preocupado com o destino da Nação, resolvi fazer uma pesquisa na base de dados do Tribunal Superior Eleitoral acerca do perfil dos candidatos a Deputado Federal e Deputado Estadual do Rio de Janeiro. Os dados para consulta estão disponíveis no site http://divulgacand2010.tse.jus.br/divulgacand2010/. No RJ, há um total de 16 candidatos cujo nome para urna eletrônica começam com a palavra "pastor": 2 para Deputado Federal e 14 para Deputado Estadual.
Ampliando a consulta para o Sudeste, encontrei os seguintes resultados:
Estado Deputado Federal Deputado Estadual
RJ 02 14
SP 06 17
MG 02 10
ES 01 02
________________________________________________
TOTAL: 11 43
Outra informação interessante é o nível educacional dos pastores-candidatos. Na região, apenas 20,37% declararam possuir nível superior completo; já 35,09% declararam possuir nível médio completo e 16,67% nível fundamental completo. 27,87% dos candidatos não completaram os níveis educacionais iniciados (fundamental, médio e superior).
Com base nestes resultados, algumas ponderações podem ser feitas:
1) Quanto a formação educacional dos crentes que nós, Igreja, estamos indicando ao pastorado. Um pastor deveria ser uma pessoa que, no mínimo, possuísse ensino médio completo. Parece-me pouco provável que um crente, por mais fiel, seja capaz de estudar teologia (com direito a aulas de grego, hebraico, filosofia, psicologia, arqueologia, etc) sem os devidos conhecimentos de português e matemática do ensino médio. Daí, uma das causas (não é a única, por certo) da falência da ortodoxia teológica deve-se à precariedade na formação do Ministro. A multiplicação das heresias também se dá devido ao pouco ou nenhum conhecimento literário da Bíblia, das figuras de linguagem, etc. Como explicar as complexas relações psicológicas-afetivas? Obviamente se a formação é ruim, o exercício da função será do mesmo porte. Imagine um engenheiro diplomado que não sabe as 4 operações? Você confiaria a construção de sua casa à ele?
Por outro lado, se a Igreja identifica um irmão que tenha realmente vocação para o ministério, deve investir em sua formação secular (aliás, a Igreja deveria ser responsável por melhorar os indíces culturais de seus membros, não só por meio do incentivo, quanto por meio da educação direta). Não lançá-lo imediatamente num seminário ou mesmo ordená-lo sem a devida capacitação, o que acaba fazendo com que aquele irmão seja apenas um objeto de uso - visão utilitarista.
2) Quanto a formação espiritual dos crentes que nós, Igreja, estamos indicando ao pastorado. Aqui, refiro-me ao pecado conhecido como procrastinação. Num país como o Brasil, cheio de assimetrias dos mais variados tipos, é frequente o abandono do estudo em prol do atendimento de necessidades mais imediatas. Porém, novamente, nós - Igreja - precisamos fazer a nossa parte quanto a esta importante questão. É preciso ensinar aos crentes em geral e aos candidatos ao pastorado mais especificamente que eles devem terminar tudo aquilo que um dia começaram; não é correto abandonar as coisas sem concluí-las. É preciso também incentivá-los neste quesito. Começou, vá em frente! Parou/foi obrigado a parar? Retorne já de onde deixou e conclua!
Aquilo que foi adiado para depois, num tempo remoto onde um eventual conjunto de combinação de oportunidades, acaba invariavelmente abandonando o que iniciou. Quando não concluímos algo que começamos, isso mina a nossa força de vontade, fazendo com que sejamos mais facilmente desestimulados diante do menor sinal de problemas em qualquer nova tentativa. Isso resulta em stress, sensação de culpa, perda de produtividade e vergonha em relação aos outros, por não cumprir com suas responsabilidades e compromissos. As causas psicológicas da procrastinação variam muito, mas geralmente tendem a fatores como ansiedade, baixa auto-estima e uma mentalidade auto-destrutiva.
Esse é um dos motivos pelos quais muitos pastores vivem alternando estratégias ministeriais e nomes de Igreja. Começam algo mas diante do primeiro sinal de problema desistem e mudam de estratégia. Começam e terminam células/grupos familiares, começam/terminam seminários, começam/terminam campanhas de oração... começam e terminam com a mesma rapidez que começaram. No fundo, são pessoas feridas e frustradas. Desejam muito acertar, mas o seu desejo não consegue vencer o desânimo que surge; acabam então abrindo mão do sucesso por uma posição mais cômoda. Então lamuriam-se de não haver alcançado. Esquecem-se de que a "vida é luta renhida: Viver é lutar. A vida é combate, que os fracos abate, que os fortes, os bravos só pode exaltar!"
O reformador Calvino tinha um alvo muito claro quanto à educação. Ele desejava que os alunos das escolas de Genebra fossem futuros cidadãos da cidade, bem preparados "na linguagem e nas humanidades", além de terem formação cristã e bíblica. O currículo que ele ajudou a elaborar tinha ênfase nas artes e nas ciências, além da ênfase nas Escrituras. Outro ponto das convicções religiosas de Calvino era o entendimento de que todo conhecimento vem de Deus, quer seja o conhecimento "sagrado", quer seja o "profano". Calvino tinha uma visão ampla da cultura, entendendo que Deus é Senhor de todas as coisas e que, por isso, toda verdade é verdade de Deus (http://apenas-para-argumentar.blogspot.com/2010/07/o-resultado-do-enem-2009-e-evasao-da.html).
Uma imensa maioria doas pastores americanos ostentam o título de "doutor". Na Idade Média isso era muito comum. Tomás de Aquino era conhecido como "Doctor Angelicus". Lutero era "doutor em Teologia". Aqui, no Brasil, ficamos presos em falácias tupiniquins do tipo "fulano que aparecer", "comprou o título", "isso é soberba, coisa de homem", "coisa de gente religiosa", amplamente proferidas por alguns que se julgam a si mesmos "o parâmetro de seguidores do evangelho", que se acostumaram com a qualificação de "voz da Igreja Evangélica Brasileira", e coisas do tipo. Ora, é muito mais preferível que a Igreja esforce as mãos dos seus pastores, levando-os a alcançarem conhecimento acadêmico teológico e, se possível, secular também!
Por fim, considere o seguinte: Sempre que houve omissão por parte da Igreja, em qualquer área da sociedade, quando era necessário pronunciamento teórico-prático, isso redundou em prejuízo para a Igreja e para a própria sociedade. Até quando vamos contribuir para a perpetuação das injustiças e desigualdades sociais que o Brasil experimenta há muito tempo, mantendo um modelo de falido de Igreja? Até quando vamos ficar discutindo "O Ser e o Nada", num verdadeiro moto contínuo de justificativas ideológicas para a inatividade profética e sacerdotal da Igreja frente a uma sociedade cada vez mais distante de Deus? Até quando vamos passar ao largo daqueles que sofreram nas mãos dos salteadores deste mundo tenebroso, prostrados a beira do caminho?
A você, candidato, que é pastor, evangélico, ou que professa qualquer outra religião ou credo, e que lê este texto, pergunto: para quê você se candidatou? O que você pretende fazer para abençoar, como político, a vida dos desvalidos, dos pobres, dos andrajosos, das víuvas, dos órfãos? O que pretende fazer para garantir o acesso igualitário à educação, à saúde, ao lazer? Para construir uma sociedade mais livre, justa e solidária, promovendo o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (CF, Art 2º)? Para manutenção da inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias (CF Art. 5º)? O que você fará para efetivamente garantir os direitos e deveres individuais e coletivos?
Por favor, como brasileiro e eleitor eu te peço: não seja mais um a usar a máquina pública em benefício próprio. Não seja mais um a virar tema de piada em programas humorísticos, mais um a ser objeto do descrédito e ódio popular. Porém, como pastor, eu o exorto: pondere bem, com muito cuidado, as tuas reais intenções que te levaram a candidatar-se. Deus escuta o clamor do pobre, a voz deles sobe diante do Senhor pelas opressões e injustiças cometidas nesta Nação contra eles, desde a sua fundação. Um dia, você comparecerá diante do Juiz de Toda Terra e naquele dia dará contas a Ele; o que terás para apresentar? E aí você se não tiver nada que presta a mostrar, principalmente se você foi pastor e político ao mesmo tempo; afinal, a quem muito é dado, muito será cobrado!
Pense nisso. Deus está te dando visão de águia!
2 comentários:
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Pr. Ricardo,
ResponderExcluirEsta advertência é tão importante quanto a necessidade de votarmos com consciência e discernimento.
O que nota-se é que a maioria dos candidatos-pastores não entenderam bem nem uma coisa e muito menos a outra, pois os que já foram eleitos no passado não fizeram muita diferença nos resultados das votações importantes ou das decisões das casas que fizeram parte.
A ausência de formação adequada para as duas funções e diria missões é uma comprovação disso.
As perguntas que não querem calar são: Como pode alguém ser um bom político se não consegue sequer pronunciar uma frase no programa eleitoral da TV? Como poderá articular, argumentar, analisar e lutar em prol dos interesses e necessidades do povo se não possui capacidade básica para se comunicar e raciocinar muita vezes sob pressão sendo isso quase que fundamental para ser um bom político?
Realmente precisamos como Igreja repensar nossa postura diante disso tudo e lembrar (como bem o fez) aos tais políticos cristãos que não somente prestarão contas aqueles que os elegeram mas também ao Senhor que os criou.
Texto atual e utilíssimo a Igreja atual.
Em Cristo,
Pr. Magdiel G Anselmo.
E assim seguem os irmãozinhos sendo manipulados,Quanto mais ignorante,mais fácil de ser enganado,mais fácil de sofrer lavagem cerebral dos fariseus modernos.Basta ver que a própria Bíblia é lida de forma incorreta e consequentemente mal interpretada.Os blogs estão aí para que constatemos a realidade dos fatos:quanta falta fazem os bancos escolares!Logo,logo surgem os espertalhões trocando voto por todo tipo de benesse e ainda assim se dizendo mandado por Deus.
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